sexta-feira, novembro 21, 2008

E fico devendo;

E o tempo passa, e a vida segue num ritmo de trem bala, sem olhar pros lados, e ver que na curva fechada várias partes ficaram para trás.
É difícil assumir que eu errei em usar meu tempo de maneira indiscriminada. Preciso de um mestre do tempo pra me ensinar a ser onipresente. E talvez oniciente, sei lá.
E fico devendo...
Devendo à sociedade um novo cidadão; aos meus pais, um bom filho;
aos amigos, a presença; às meninas, um café; ao meus amores, um pouco da minha atenção; aos pinguços, mais uma rodada de goró; à minha amiguinha dançarina, um minuto de forró;
aos meus estudos, fico devendo tanto...
Aos professores, fico devendo a gratidão; aos colegas, fico devendo a saudade;
ao tempo, o trabalho; à menina que eu queria tanto ver novamente, mais uma hora de um sorriso sincero.
Ainda devo ao meu corpo uma explicação. Uma resposta.
Ainda devo àquela moça um pedido. Um que eu nunca fiz.
Devo ao clima a minha angústia, a minha inquietação.
E fico lhes devendo o ombro amigo e o bom ouvido. E fico devendo.
E fico devendo à morte. A ela eu devo o tempo. Ainda não teve tempo de me carregar.
Um dia eu paro de correr. Só não acredito que um dia eu vá parar de dever.
Gui.

quarta-feira, novembro 19, 2008

Promessas...

Ardia o fogo. Juro por Deus que era enorme.
Pelo menos uma hora e meia se passou e queimavam as caixas de leite numa dessas curvas acentuadas da serra. Eu ainda não sei se foi no Paraná ou em São Paulo, mas aposto as poucas notas que tenho na carteira na teoria do Paraná.
Saí do ônibus e comi um sanduíche pra matar a minha fome. OUvi os homens conversarem lá fora. Homens simples, brutos, da estrada. E eu andava de um lado pro outro naquele friozinho que fazia (Definitivamente : Paraná) .
O motorista contava aos outros o que acontecera e lembrava de outros acidentes de saques na estrada. Divirto-me pensando na loucura que deve ser um assalto no meio da estrada. Eita, mundinho de merda.
E o meu celular, sem sinal, não me deixava nem mandar uma mensagem ao meu amor, só pra dizer que sinto saudades. Saudades que eu não lembrava que existiam e que me cortam o peito desde que eu assumi coragem suficiente pra compreender que ela é o meu vício.
Lá pelas tantas, a polícia começa a distribuir caixas de leite, e fico naquela dúvida: "pego ou não pego?"
Na verdade, eu decidi não pegar. Não queria andar, e nem carregar peso. Continuei a devanear.
O que me fez correr pra dentro do ônibus e sentar a escrever foi uma situação um tanto peculiar.

Sobe a rodovia um casal carregando caixas de leite longa vida. Quando passam pela rapaziada, comentam a distribuição, depois de um curto papo, e continuam o caminho.
Dali a pouco cessam os comentários e o motorista quebra o silêncio:
-Rapaz, isso daí é um veneno!
Eu imaginei qualquer outra coisa, e não leite...
-Esse leite de caixa - continuou o motorista - faz um mal, credo! Às minhas meninas eu não dou, tá louco! O médico foi mostrar à minha esposa a quantidade de coisa que eles botam nesse leite... nunca mais. Tratamos de dar todas as caixas que estavam lá em casa.

...
Juro por Deus que nunca mais tomo leite! Doravante, juro que só bebo cachaça! Como será que fica misturada com café?

sábado, novembro 01, 2008

curto n° 9;

Corria os corredores como um louco todos os dias.
Era sempre assim. Acordava vinte minutos depois do relógio com o sol entrando em seu quarto. E João descia as escadas como louco, jogava uma água no rosto e pedalava as duas longas quadras até aquele lugar que ele chamava de escola.
Quando me contaram sobre o problema do menino em cumprir seus horários, eu ri lembrando da minha adolescência.
Nunca entendera a razão de levantar-se cedo pra ouvir um careca falando sobre o quanto era bonita a literatura de um desses velhos escritores que todos dizem apreciar, mas ninguém realmente gosta. E era segunda-feira. Tudo o que conseguia ver era a menina do outro canto da sala. João conhecia seu nome, seus gostos, suas manias... criara um padrão para compreender o comportamento de sua musa. Ela se chamava Ana. Ana, Ana, menina tão linda, estudiosa, caprichosa, popular. Só se for em seus sonhos, meu rapaz.
Ana, que não ligava para caprichos. Só conhecia festas, namoros, jogos, drogas, sons, viagens e nunca entendera a razão de estar na escola. Ignorava completamente a existência de um tal João. Mesmo que este passasse as manhãs a observá-la.
Era uma vez dois jovens no maior colégio da cidade. Um rapaz e uma linda menina. Nunca trocaram uma palavra. Ou se trocaram, foi a palavra mais importante da vida de João; ao mesmo tempo, foi a mais insignificante na vida de Ana.
Se você procura um final feliz, busque outro tipo de texto. Aliás, essa história não tem final.
Acabou-se meu tempo de intercâmbio naquele país e eu nunca cheguei a saber o que aconteceu com aquelas pessoas daquela escola.
Não espere grandes surpresas.


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Quando a gente chegar...

Sabe quando você tá com aquela vontade que surgiu do nada e sem a menor explicação?
Sabe quando você ignora essa vontade e fica com uma incrível dor de corno?
Pois então. Tou assim.
Vou lhes contar uma história...

A cada ano ele trocava de estilo. A cada ano era uma mania nova. Foi-se o ano do esporte.
Um ano em que o menino só fazia esporte, da escola pra piscina, da piscina pra escola, da escola pra pista da pista pra piscina... o único prazer.
Foi-se o ano do roquenrou. De casa para a escola, da escola pro estúdio, do estúdio pra casa, da casa pra banda, da banda pro estúdio, do estúdio pro outro. Dois prazeres (a piscina e a banda).
Chegou o ano do amor. Paz e amor. De um amor pra outro, pra outro e pra outro. E a banda e a piscina. E a piscina secou. E a banda gritava muito alto, rodava por aí e cantava o som que fazia estremecer os pêlos da orelha do paulão... Aí veio o medo, a esperança a iminência de uma prova. Uma não, ONZE provas. Aí acabou tudo. Acabou o amor, acabou o esporte, acabou o roquenrou, acabou o tempo, acabou o vento, o sol, o fim e o começo. Da escola, pra escola, pra outra escola, pra casa, pros livros, pra escola, pra outra, pra outra... e nem a geléia da porcaria da música com café me salva. Somente planos, planos, planos de um novo ano incerto. Plano A e plano B. E as reservas que antes não faziam parte do meu corpo.
Já dizia eu pro meu amor quando tudo ainda era simples:

"Traga de volta os dias bonitos
Os tempos em que o coração batia,
Eu não vou mudar
por mais que um dia tudo acabe"


A vida da gente nunca é tão legal quanto parece ser vista de fora.
Bom dia pra vocês, eu vou fazer mais uma prova.