sábado, agosto 11, 2012

Os cabelos

Que me escapam das amarras balançam ao vento. Forte, forte, vento que faz sentir uma sensação deliciosa na barba grande e mal aparada, quando eu pedalo apressado durante a madrugada. Já faz dois dias que sinto essa energia contida justamente na hora de deitar. Só há uma resposta: pegar a chave, descer as escadas e sair pedalando pela noite. 
É apaixonante ver as coisas enquanto todo mundo dorme. E um jazz agitado e doido toca nos meus ouvidos, como se entorpecido pelo silêncio dos sorrisos entre as sétimas. Ai, as sétimas, as sextas e as nonas... Quem sabe o saudosismo não é só reflexo do sabor do vento em minhas coxas? Dói um pouco, mas é a melhor dor do mundo. Em duas horas estou em casa de novo, pronto pra relaxar, pra descansar. Mas não é só isso.
É a inquietação do mundo. É o descanso da calma, é o acordar da emoção, da agitação. 
O mundo não vai acabar amanhã. Então por que essa minha pressa de ver tudo o que tem pra ver por aí? Não sei. Eu só sei que eu tenho medo de esquecer e de ser esquecido. Tenho medo da solidão. Contraditório, porque me alivia a cabeça justamente a solidão da madrugada, pedalando. Só eu e os seguranças com quem troco "boa noite". Sabem bem eles que gostariam de estar pedalando como eu para suas casas, em vez de vigiar falsas ruas, enquanto débeis criaturas inofensivas e ignorantes dormem em seus apertamentos. Bem protegidos os tais. Por quê? 
Pra que tantos muros, se o bom da vida é derrubá-los? É ver o que está além deles, é conversar com o diferente, aprender as marchas de outras línguas, outros olhares.
Estou retrocedendo. Estou com dificuldade em entender a relação dialética entre o indivíduo pensante e o pensamento coletivo na destruição da sociedade da alienação. A ponte é o partido revolucionário! - Gritam Trotskys e Morenos em meus ouvidos. Eu sei, eu sei. Preciso levantar da cama! Revolucionar minha própria estrutura, meus próprios medos. Pegar a bicicletinha que roda de um lado pro outro em meu cérebro, dominá-la em direção à vida. Organizar as coisas, ter tempo pra ler, pra saber, pra viver, pra crescer, pra amar, amar, armar a mim mesmo de todas as flores e cores pra construir um mundo livre, que não seja só dentro dessa cabeça esfumaçada, que agora olha o céu estrelado da varanda do meu apartamento. A primeira estrela ainda não apareceu. Nem eu.

G. Tritany