Lá de cima, as pessoas felizes piscam luzes de seus apartamentos. Devem estar planejando amor ou fazendo uma viagem. Tanto faz. Pra mim, tudo o que resta é aceitar a solidão crescente, escondida sob abraços solidários.
Os carros passam, as pessoas alegres se embebedam um pouco mais, e tudo parece normal. Exceto pelo vento, que parou. Eu esperava chegar aqui na beira do início de tudo e sentir um forte vento no rosto. Que cortasse as feridas do rosto cheio de barba, que levasse embora a tristeza de meu coração. Contento-me em admirar a paisagem morta e contemplar as relações quase humanas dos seres noturnos que habitam esse lugar. Olho para dentro do meu ego e vejo um enorme olho me julgando de volta. E todas as coisas ruins que eu queria digerir aparecem de novo, como ruminação do velho e apodrecido vômito da bile que me escorre à boca no momento de cólera embriagada.
Que bom estar só para sentir isso. Não aguento mais dar explicações. É como se para tudo que parece tão complexo como a rrealidade houvesse um nome que confirmasse a simplicidade ignorante e duvidosa das emoções dolorosas. Acabou a minha paciência!
Eu não quero mais meias verdades. Não quero mais esconder dias tristes. Estou cansado das histórias de amor inacabáveis e dois relacionamentos conturbados. Estou cansado. Tudo o que eu vejo é cego e nada leva a lugar nenhum a não ser a velha saudade de ser um de novo e sentir que sirvo para fazer alguém feliz, nem que seja só a mim mesmo.
Acabou o cigarro e, pelo visto, não vou ter vontade de voltar. Ainda é cedo pra reabrir antigos debates, e eu preciso controlar minha vontade louca de gritar até destruir tudo, até que não exista mais nada que possa me fazer sentir que a vida não vale à pena ser vivida assim. Queria voltar uns 5 ou 6 anos. Viver os amores e os desencantos, as intermináveis horas entre um e outro dia de sorrisos frios, e o aconchego de bochechas geladas. Não posso desejar mais.
Já chega.
G. Tritany